terça-feira, 2 de novembro de 2010

 A IMAGEM FIXA Por Eugênio Bucci em 2/11/2010
(QUE NO ENTANTO SE MOVE) Um país de todos... (e todas?)

No domingo (31/10) à noite, nos estúdios da Rede TV!, o jornalista Kennedy Alencar lançou a pergunta: "Qual a sua expectativa para o governo Dilma?". Aconteceu de eu estar lá, na bancada, à direita do âncora do programa. Assim, coube-me responder à indagação. Respondi com algo que pode ser lido como anedota, embora não seja apenas anedota. Arrisquei um palpite sobre a comunicação do governo Dilma Roussef. Segundo a profecia humorística que me ocorreu, antevi a inclusão da palavrinha "todas" na marca de fantasia do governo federal.

Recapitulemos os fatos para entender melhor a anedota (ou não). Com Lula, o publicitário Duda Mendonça conduziu a idealização da marca de governo. Ela ficou assim:

Desde então, o selo fez fama (deixemos a fortuna pra lá) e correu cantos e meios deste propalado "país-continente", em placas nas estradas, anúncios de jornal, publicidade na TV. A assinatura, "Brasil, um país de todos", foi motivo de orgulho e de piada, conforme o público e o contexto.
Olhei muito para essa logomarca durante muitos minutos, em ocasiões distintas. Umas tristes, outras felizes. O "A" embandeirado, ufanista e informal, posto feito um campanário central na cidade de letras multicoloridas, serve de âncora. O resto é óbvio: o azul um tanto tucano do "B", o amarelo do "R", o lilás (ou será rosa?) ao fundo, o negro do "I" e o vermelho petista do "L", temos um arco-íris ideológico, multiculturalista, baianíssimo, pop. Uma República alegre, carnavalesca e, nem por isso, menos oficial. Um pouco festa junina, um pouco Alfredo Volpi, como que nos dizendo "vem que tem lugar para todas as cores".
 

Ou quase todas. O termo "todos", posto assim, apenas no masculino, pode incomodar alguns – e algumas. O dito "masculino inclusivo" (o quê?), o masculino que "contém" o feminino, ou, mais ainda, que tem o poder de conter o feminino, acaba por omitir o feminino. Ele tem a desvantagem de não realçar a presença das mulheres dentro do "país de todos".
Brasão da República
Pensando nessas tolices, ali por 2003, eu via certa graça na possibilidade de que o bordão pudesse ser visto como politicamente incorreto pelas feministas mais, digamos assim, feministas. Eu não acho que ele seja nada machista, mas desconfiei, desde quando vi o símbolo pela primeira vez, que muitas pessoas – no feminino e no masculino – que trabalhavam no governo fossem olhar para ele como se ele fosse uma pérola de machismo involuntário.
Muitas dessas pessoas se esmeravam em dizer "todos e todas" em todas as solenidades e todos os comícios. Em todas as cerimônias oficiais, várias das autoridades do governo Lula, ainda que não todas, ao iniciar um pronunciamento, liam a nominata e depois emendavam: "Bom dia a todos e todas". "Boa noite, todos e todas". Uns e umas variavam, e punham "todas" na frente de "todos", como quem diz "senhoras e senhores". Isso foi indo, foi indo, foi indo e chegou a tal ponto que agora uma mulher do governo Lula se tornou presidente (ou presidenta) do Brasil. É histórico, sem dúvida, que tenhamos uma mulher como presidenta. Mais que histórico, é histórica.
Mas e agora? Qual será a marca do governo da Dilma?
Poderia ser esta, só com a palavra "Todas", só para compensar:


Ou esta, só para conciliar:

No fundo, e agora falando um pouco mais sério, mas não muito, ou não muita, Dilma faria melhor se não adotasse marca alguma. Faria melhor se identificasse o governo federal apenas pelo Brasão da República, pela bandeira nacional, mais nada. Sobre essa história de logomarcas oficiais, há outras considerações que importam mais e vão além das anedotas.